Conheça detalhes da vida da estilista Zuzu Angel, que levou a luta pela verdade para seu trabalho e para suas criações.
A estilista Zuleika Angel Jones, conhecida como Zuzu Angel, nasceu em Curvelo, Minas Gerais, em 5 de junho de 1921 e faleceu no Rio de Janeiro dia 14 de abril de 1976 aos 54 anos.
A trajetória de Zuzu é tão importante tanto para quem estuda e faz Moda quanto para aqueles que se interessam pela cultura e pela história do nosso país. Zuzu era uma criadora única, que conseguiu aplicar nas roupas que desenvolveu muitos elementos da cultura brasileira de maneira delicada e não folclórica. Além disso, Zuzu passou pela ditadura militar e foi profundamente marcada por ela: seu filho, o ativista Stuart, foi preso e morto em 1971 e seu corpo nunca foi encontrado. Zuzu também foi morta pela ditadura, como confirmam vários documentos da época que estavam escondidos e foram encontrados recentemente.
[toggle style=”closed” title=”O início”]
Nascida em Curvelo, Minas Gerais, Zuzu mudou-se quando criança para Belo Horizonte, onde começou a costurar e criar modelos, fazendo roupas para as primas. Então ela se muda para a Bahia, onde passou a juventude. A cultura e cores desse estado influenciaram significativamente o estilo das suas criações.
Em 1943, casou-se com Norman Angel Jones, que veio ao Brasil a serviço do governo americano para comprar cristal de rocha. Ela o conheceu na casa de um tio que era uma espécie de intermediário de cristais. Depois do casamento, o casal foi morar em Salvador, onde, em 1946, nasceu seu primeiro filho, Stuart Angel Jones. Em 1947, a família se mudou para o Rio de Janeiro, onde nasceram as duas filhas, Ana Cristina e Hildegard Beatriz.
Iniciou a sua carreira em 1957, no RJ, já usando o nome Zuzu Angel. E, mesmo após se separar do marido, em 1960, e o desquite, em 1970, Zuzu manteve o sobrenome Angel, que praticamente, desde o início, foi nome de sua marca, com frequência associada ao desenho do anjo. [/toggle]
[toggle style=”closed” title=”A Moda de Zuzu cria vida e ganha corpo”]
A década de 1960 foi muito especial para Zuzu. O mineiro Juscelino Kubitschek havia sido eleito presidente da república (presidiu o Brasil de 1956 a 1961) e levou consigo conterrâneos para trabalhar. Á época o presidente muda-se para o RJ, então capital federal. A esposa de Juscelino, Sarah, foi pioneira ao criar uma entidade que produzia uniformes escolares para crianças carentes. Zuzu fazia parte desta entidade. Em 1967 ela consegue apresentar suas criações para as atrizes Kim Novak e Joan Crawford. No ano seguinte, Zuzu expõe suas peças numa feira no Texas. Em 1969 passa a integrar o Fashion Group, uma organização com sede em Nova Iorque. Em 1970 acontece, então, o lançamento oficial de sua marca nos EUA. Este lançamento possui várias características especiais a serem destacadas: Zuzu era a primeira mulher da América Latina a integrar o Fashion Council.
A coleção que ela estava apresentando era dividida em 3 partes:
-um grupo era inspirado nas baianas
-um grupo era inspirado no casal Lampião e Maria Bonita
-o terceiro grupo era inspirado nas rendeiras.
Assim, Zuzu apresentou a moda e a cultura brasileiras ao mundo todo e fez enorme sucesso. Suas peças passaram a ser vendidas na Bergdorf Goodman, em NY.
Enquanto isso, seu filho Stuart está envolvido na militância contra o regime militar, que havia se instalado no país em 1964. Stuart era integrante do MR-8, grupo de ideologia socialista que fazia a luta armada contra o regime militar.
Em 14 de março de 1971 (alguns documentos apontam a morte de Stuart como 14 de abril de 1971) Stuart é preso, torturado e morto. Como todo preso no regime militar, o governo não deixa claro como, onde e em que condições Stuart foi preso. Zuzu passa então a procurar pelo filho e isto passa a ser seu objetivo de vida. Um companheiro de prisão consegue enviar uma carta a Zuzu relatando como Stuart havia sido morto. Após o recebimento desta carta, Zuzu Angel começa a denunciar as atrocidades da ditadura.
No final do mesmo ano Zuzu apresenta mais uma coleção em NY (a International Dateline Collection III – Holiday and Resort). Nela, algumas modelos entram na passarela com uma braçadeira preta e Zuzu entra, no final do desfile, vestida de preto, em luto por seu filho Stuart. A coleção não tinha um background político, mas Zuzu aproveitou para se manifestar.
A coleção seguinte (a International Dateline Collection IV – The Helpless Angel ou O anjo desamparado), apresentada em 1972, foi toda baseada em sua luta política, denunciando as atrocidades do regime militar no Brasil. Ela passa a usar de maneira mais ampla o símbolo do anjo e os bordados retratam elementos do regime militar, como tanques, canhões e prisões. A coleção também teve boa repercussão nos EUA. Kathy Lindsay, filha de John Lindsay (então prefeito de NY) desfilou e fotografou para a coleção de Zuzu Angel. Ela mantinha-se fiel as origens e só utilizava tecidos do Brasil.
Em 1973 a estilista abre uma loja no Leblon. A loja faz sucesso. A atriz Liza Minelli a visita e passa a usar peças da marca. No mesmo ano, a International Dateline Collection V e posteriormente a International Dateline Collection VI são lançadas. Desta vez, o lançamento ocorre primeiro no Brasil e depois em NY. A International Dateline Collection VI recebeu o nome de Filha e Mãe. As fotos de divulgação mostrava mães e filhas da alta sociedade vestindo modelos de Zuzu. Em 1974 é lançada a International Dateline Collection VII.
A última coleção da designer Zuzu Angel, como ela gostava de ser chamada, foi lançada em 1975 e recebeu o nome de o Brazilian Butterfly.
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[toggle style=”closed” title=”Incômodo para a ditadura”]
Zuzu Angel era uma pessoa influente tanto no Brasil quanto nos EUA. Por isso, ela se vale de diversos artifícios para tentar solucionar o assassinato de seu filho e tentar recuperar seu corpo.
Com sua relativa notoriedade internacional, ela envolveu celebridades de Hollywood que eram suas clientes, como Joan Crawford, Liza Minelli e Kim Novak, em sua causa. Em 1975 entregou um dossiê escrito em inglês à esposa do general Mark Clark, comandante das tropas aliadas no front italiano durante a II Guerra Mundial, que estava em visita ao Brasil, no Hotel Sheraton, em São Conrado, Rio de Janeiro, para que entregasse ao marido. Em 1976, durante a visita de Henry Kissinger, então secretário de estado norte-americano, ao Brasil, Zuzu chegou a furar a segurança para entregar-lhe um dossiê com os fatos sobre a morte do filho, também portador da cidadania americana. Com um destemor que beirava a temeridade, certa vez tomou da mão de uma aeromoça o microfone de bordo de um voo para anunciar aos passageiros “que desceriam no Aeroporto Internacional do Galeão, no Rio de Janeiro, Brasil, país onde se torturavam e matavam jovens estudantes’.
A designer passa a ser, então, um incômodo para a ditadura. Em 14 de abril de 1976, por volta das 3 horas da manhã, Zuzu morre em um acidente de carro em circunstâncias muito suspeitas.
Documentos vazados pelo Wikileaks em 2013 mostram a preocupação do governo, à época, em relação aos comentários feitos pela imprensa em relação a morte de Zuzu. Um documento de 10 de maio de 1976 enviado pela embaixada dos EUA em Brasília para os escritórios em São Paulo e no Rio de Janeiro mostra a preocupação do governo norte-americano com a repercussão da morte da estilista Zuzu Angel, mãe de Stuart Angel, assassinado por agentes da marinha em 1971. “A morte de Zuzu Angel que ocorreu em 14 de abril, quando o automóvel que ela estava dirigindo deixou a rodovia após sair de um túnel no Rio, está sendo amplamente veiculado na imprensa”, diz o telegrama. “A cobertura da imprensa notou que a cena do incidente não mostrou marcas de derrapagem ou frenagem”, destaca o telegrama.
Na época o acidente foi tratado com frieza, não relacionando-o ao governo militar. No entanto, Zuzu sabia muito antes do perigo que corria. Tanto que uma semana antes de sua morte ela envia uma carta a Chico Buarque com os dizeres: “Se eu aparecer morta por acidente, assalto ou outro meio, terá sido pelos mesmos assassinos do meu filho”.
No ano seguinte, Chico Buarque, em parceria com Miltinho, compõe Angélica: Quem é essa mulher / Que canta sempre o mesmo arranjo / Só queria agasalhar meu anjo / E deixar seu corpo descansar.
Em 1998, a Comissão Especial dos Desaparecidos Políticos julgou o caso sob número de processo 237/96 e reconheceu o regime militar como responsável pela morte da estilista. [/toggle]
[toggle style=”closed” title=”A continuação”]
A filha de Zuzu, Hildegard Angel, jornalista, empenha-se em manter viva a memória e o trabalho de sua mãe. Em 1993 ela funda o Instituto Zuzu Angel no Rio de Janeiro, dedicado a conservar as criações de sua mãe e da moda cultural brasileira, como um todo.
Em 2001 o estilista Ronaldo Fraga, também mineiro, apresenta a coleção “Quem matou Zuzu Angel?” na passarela do Morumbi Fashion (precursor da SPFW). A coleção mostra todo o universo de Zuzu, em especial os anjinhos e a ocultação da morte de Stuart e de Zuzu.
Em 2006 é lançado o filme Zuzu Angel, dirigido por Sérgio Rezende, com Daniel de Oliveira e Patrícia Pillar no papel do militante-guerrilheiro e da estilista.
Zuzu foi pioneira na internacionalização da Moda autoral brasileira, mostrando um estilo próprio e não simplesmente uma cópia ou “inspiração” na Moda européia.
Para o ano de 2014 dois acontecimentos marcarão a história da estilista: em abril uma exposição ocupará o Itaú Cultural, em Sâo Paulo. Ainda para 2014 prevê-se o relançamento da marca de Moda Zuzu Angel e a comercialização da mesma numa geande rede varejista, mas maiores detalhes ainda não foram divulgados. [/toggle]
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