Uma inquietude, capaz de misturar o Nordeste, Clarice Lispector e Blade Runner, é o ponto
de partida para Bença, nova coleção de Jeferson Ribeiro.
Falar da simplicidade nordestina, suas memórias afetivas e dar forma a sua subjetividade
inquieta. Nesse mar de areia, chamado Nordeste, Jeferson Ribeiro se conecta com o mundo
para criar Bença, em sua sétima apresentação no Dragão Fashion Brasil.
Assim tem sido desde 2013, quando apresentou sua primeira coleção, o estilista baiano leva para passarela suas provocações e pensamento crítico, num trabalho delicado de unir
estrutura e fluidez, opostos complementares dentro do seu minimalismo arquitetônico.
Preocupado sempre em estar à margem, constrói uma linguagem com a estranheza bela e
dissonante. A partir deste modo de pensar e provocado pelas heranças culturais de seus avós, o designer desenhou uma coleção que passeia entre o universo da personagem nordestina retirante Macabéa, de Clarice Lispector, e da replicante Rachel, de Blade Runner.
Mulheres tão opostas, com mundos internos únicos, unidas pela força e beleza fora dos padrões.
Para dar asas a essa mulher de um nordeste remoto em suas lembranças, as peças são estruturadas com mangas amplas, ombro marcado e cintura ajustada. Volumes contrastam com alças finas, recortes assimétricos e uma dose de drama, peculiar ao trabalho do estilista.
Tão sensível e improvável, suas criações são capazes de transitar entre o dia e a noite, da praia ao asfalto.
No caminho errante da experimentação, Bença surge com uma cartela de cores intensas como o marrom pau-a-pique, o vermelho amora, verde garrafa, rosa poeira e rosa argila. Como uma poesia neoclássica, a simplicidade das formas cobre o corpo em camadas e cria tensão visual ao encontrar as cores. Os volumes das cabaças, presente nos quintais e artesanatos por todo o Nordeste, dão formas a mangas e recortes, trazendo organicidade ao linho, escolhido por rememorar o toque e textura dos ternos e vestidos sertanejos.
Sem esquecer o diálogo com o contemporâneo, Bença é uma advertência para os dois rankings nacionais liderados pelo Nordeste, o de maior quantidade de lares chefiados por mulheres e índice de violência contra a mulher. Como o costume local de pedir a benção às mães ao sair de casa, enaltecemos o respeito ao feminino, sua força e luta diária para sobreviver numa sociedade que insiste em coloca-lo em segundo plano.
“Bença é meu diálogo com o tempo e com a minha subjetividade, o desajuste de lidar com o tempo e as memórias. Não lido bem com a impermanência, por isso gosto do que é durável e firme. Tenho um seio familiar de mulheres fortes, e aprendi com elas a valorizar o perene. Dialogar com a moda é estar o tempo todo saindo do conforto e testando os limites do permanente”, afirma o estilista.